quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Um castelo em ruínas



E lá estava eu. Sentada na escada de casa, vendo roupas espalhadas, móveis empoeirados, como se ha muito tempo ninguém morasse ali. Ninguém que apertasse a campainha teria uma resposta, ninguém que telefonasse seria atendido. Eu nao queria mais nada, nem ouvir que a dor passaria, nem flores, nem que abrissem as janelas para que algo ali ficasse claro.
Meu coração parou. Minha vida parou. E eu já nao sabia mais quem eu era, ou porque ainda insistia em ficar em um mundo que só chegou a ter graça quando era dividido com ela. Eu só queria ficar mais um tempo sentada ali, quem sabe mais alguns dias, noites.. Até nao restar ar. Aliás, eu ja me sentia assim, como se ja nao tivesse mais ar para respirar, o peito se sentia apertado, como quando ela me abraçava forte e quase quebrava minhas costelas, so que agora o aperto nao era quente, era frio, era congelante. Aquela escada era como uma cadeira com algemas, colocada dentro de alguma caverna em que ninguém mais seria o bastante para conseguir ver e entrar. Sabe quando alguém vai embora e nas malas coloca tudo que você tinha de bom?! Sabe quando no meio das tralhas, arrancam seu coração, colocam em qualquer embalagem plástica e metem naqueles bolsinhos pequenos reservados para separar meias e lingeries?! Sim, era exatamente ali que eu vi meu coração a partir do momento em que ouvi o ziper da mala fechar e o portao sendo fechado com força.

Partiu. Partiu da minha vida, partiu meu coração. Levou uma parte de tudo que demorei anos para construir e direcionar a alguém. Pegou meus melhores sorrisos, minhas coreografias engraçadas, dançadas enquanto vestia pijamas com estampas infantis, levou o melhor banho de chuva compartilhado, levou o meu melhor olhar, levou a vontade de estar arrumada, de escolher o melhor perfume, levou. Nada de tão bom trouxe para conseguir me despir tão bem de mim, mas o fez. Talvez tenha jogado na primeira lata de lixo pela qual cruzou, abriu a mala e tirou daquele bolsinho meu lambuzado coração, que enquanto estava perto dela, mesmo longe de mim, ainda batia, ainda estava quentinho. Ela era o fósforo que acendia a minha chama. Surtiu em mim o calor mais tórrido, foi quem me fez sentir viva de verdade e quem me matou. Matou sem assassinar, sem apontar arma ou colocar veneno no meu drink. Apenas matou. E nem pena sentiu e nem remorso, afinal, quem ia querer um coração tão entregue de bandeja?!

Nem eu.

Arruinou meu castelo, meu conto de fadas sem príncipe, me fez sentir o sapo, a bruxa, menos a princesa. Estragou tudo. Absolutamente tudo que poderia ter dado certo, pegou e jogou pela janela da torre. Extraviou pela floresta nada encantada que se veste de algum boeiro sujo, fedido a alcool na cidade. Houve beijo, nao no final, e o que me despertou do sono que poderia durar 100 anos, foi ouvir cada vez mais distantes os passos que ela dava em direção a qualquer outro lugar que nao fosse para perto de mim. Sem vestido longo, sem aqueles casamentos barulhentos, sem cavalo branco. Meu conto de fadas foi quase um "Cinderela" reverso, quando pensei que tinha tudo, já nao tinha mais nada, so restaram as irmãs más: Solidão e Melancolia. E a madrasta, Saudade. No meu armário só restaram trapos e nao ha mais espaço para a fada madrinha Esperança, a carruagem que me busca toda meia noite não é mais uma abóbora, agora ela se fantasia de insonia.


Por Marina Consoli.


















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